Ministro Péricles Aurélio de Queiroz, relator

O Superior Tribunal Militar (STM) condenou um capitão da reserva do Exército a três anos de reclusão por exigir propina de uma empresa a fim de garantir que ela saísse vencedora num processo licitatório referente à compra de 65 ônibus.

O oficial atuava à época como chefe da Seção de Licitações do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP), localizado em Brasília.

De acordo com a denúncia, o pedido de vantagem indevida por parte do militar configurou o crime de concussão, conforme o artigo 305 do Código Penal Militar (CPM). Narra a acusação que o militar procurou o representante legal da empresa e sugeriu que tinha influência para fazê-la vencer o processo mediante o pagamento de um percentual do futuro contrato, orçado em mais de R$ 17 milhões.

Mais tarde, durante o pregão eletrônico para a aquisição dos ônibus, o militar interceptou a documentação da empresa e por meio de mensagem eletrônica de celular informou a ocorrência de um suposto erro que resultaria na sua inabilitação.

Quando o preposto chegou ao BGP para fazer a correção, o militar lembrou do assunto que haviam tratado anteriormente e sugeriu, por meio de gestos, o valor de uma possível propina. No entanto, como consta nos autos, a empresa negou-se claramente a participar do crime.

O acusado foi denunciado à Justiça Militar da União e em sessão de julgamento realizado no dia 24 de janeiro de 2017, na 2ª Auditoria de Brasília, o Conselho Especial de Justiça para o Exército, por unanimidade, condenou o acusado, pelo crime de concussão, a seis anos de reclusão.

Recurso ao STM

Na apelação julgada no STM, na tarde desta terça-feira (20), o Plenário analisou recursos do Ministério Público Militar (MPM) e também da defesa do réu.

O recurso interposto pelo Ministério Público Militar pedia a “aplicação das penas acessórias previstas no art. 98, incisos V e VI, do CPM, quais sejam, a perda da função pública e a inabilitação para o exercício de função pública”, tendo em vista que o acusado ocupa cargo efetivo decorrente de concurso público, fora do Exército Brasileiro. 

Ao analisar o pleito, o ministro relator do processo Péricles Aurélio de Queiroz negou o pedido, pois lembrou que o cargo atualmente ocupado pelo réu é de natureza civil e que o ingresso nos quadros da administração pública federal ocorreu em data posterior à prática delitiva.

O magistrado fundamentou a negativa citando jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) segundo a qual “a pena de perdimento [da função pública] deve ser restrita ao cargo público ocupado ou função pública exercida no momento do delito.”

Vantagem indevida

Em seu recurso, a defesa sustentou a tese de atipicidade da conduta, tendo em vista que a acusação não descreveria todas as elementares do crime de concussão, em especial o núcleo verbal do tipo do artigo 305 do CPM: “exigir” vantagem indevida, pois inexistiria qualquer alusão a “ameaça, constrangimento ou imposição”.

Ao apreciar esse pedido específico, o ministro relator afirmou não restar dúvida de que a denúncia trata de um “fato típico”, pois o militar deixou “claro seu objetivo de receber vantagem indevida para influir no resultado de vultoso contrato de aquisição de dezenas de ônibus pelo Exército Brasileiro”.

Como lembrou o magistrado, após a negativa da empresa em concordar com a manobra ilegal, o oficial comunicou ao preposto que havia encontrado um erro na proposta. Apesar de o pregoeiro ter negado a ocorrência de qualquer equívoco na documentação, a empresa permaneceu com o status de “recusada” no sistema de licitações, durante dez minutos.

Diante dos fatos, o relator concluiu ter ficado claro o intuito de incutir no preposto o receio de ver prejudicada a empresa que representava, pelo não pagamento da vantagem indevida solicitada. Diante do risco de uma possível desclassificação, o militar dirigiu-se à vítima de forma ameaçadora e capaz de configurar o tipo penal em questão.

O ministro relator declarou que as provas colhidas no transcurso da ação penal comprovam a prática delitiva. Ressaltou, por exemplo, que à época em que ocorreram os encontros, entre os meses de setembro e outubro de 2012, sequer havia se iniciado o procedimento licitatório, o que também denota “a conduta do acusado de buscar um licitante específico para, como expressamente afirmou, praticar um ato negocial”.

“Isoladamente considerados é possível afirmar que tais encontros entre o acusado e a testemunha não configuram prova direta da prática criminosa. Contudo, além de serem claramente violadores dos princípios que orientam uma administração pública proba, nos termos do art. 37 da Constituição Federal e da Lei 8.429/92, estão alinhados com outros elementos de convicção que, em seu conjunto autorizam a formação do juízo condenatório.”

Em seu voto o ministro concluiu que, embora o acusado não fosse o pregoeiro da licitação, ele exercia total influência sobre o tenente designado para tais funções. A pretexto de auxiliar o pregoeiro, o oficial influiu diretamente em todas as fases da licitação, desde a confecção do edital até a habilitação do licitante proponente do lance vencedor.

Ao final, o relator decidiu acatar os argumentos da defesa para diminuir a pena final imposta pela primeira instância. Entre as razões para a decisão, o magistrado destacou não ser possível aplicar a agravante genérica do art. 70, inciso II, alínea “g”, do Código Penal Militar, que prevê a majoração da pena-base em um quinto pelo fato de à época o acusado exercer as funções de chefe da Seção de Licitação, sendo sua conduta “juridicamente incompatível com os deveres inerentes ao cargo”.

“O fato do Apelante exercer cargo ou função é elementar do tipo do crime de concussão, motivo pelo qual não há como se majorar a pena em decorrência de tal fato, seja a título de circunstância judicial, seja em decorrência da aplicação da agravante genérica do art. 70, inciso II, alínea “g”, do Código Penal Militar”, declarou o ministro Péricles, que fixou a pena definitiva em três anos de reclusão.

A sessão de julgamento foi transmitida ao vivo pela internet

Processo relativo:

APELAÇÃO Nº 40-78.2013.7.11.0211 - DF 

 

O ministro-presidente do Superior Tribunal Militar, José Coêlho Ferreira, e o vice-presidente, ministro Lúcio de Barros, estiveram, nesta quinta-feira (22),  com o presidente da Câmara Federal, deputado Rodrigo Maia, para tratar de matéria relativa à Justiça Militar da União (JMU). 

Os ministros  solicitaram ao deputado a inclusão na pauta de votação do Plenário o Projeto de Lei nº 7683/14, de autoria do Superior Tribunal Militar, que promove reformas no sistema da Justiça Militar da União.

A reunião foi realizada no Gabinete da Presidência da Casa Legislativa.

Julgamento monocrático

Uma das principais alterações  que o PL 7683/14 traz é o deslocamento da competência para o julgamento de civis, na primeira instância, que passará a ser feito exclusivamente pelo juiz federal de carreira.

Atualmente quem julga todos os casos na primeira instância são os Conselhos de Justiça, órgãos colegiados e compostos por quatro juízes militares (oficiais das Forças Armadas) e mais o juiz federal.

Os Conselhos de Justiça passarão a ser presididos pelos juízes federais da Justiça Militar e não mais por um juiz militar. Com a mudança, o processo tende a ser mais célere, já que se manterá um mesmo juiz na condução de todo o processo; pois os militares que exercem a função de juízes nos Conselhos são escolhidos por meio de sorteios e substituídos periodicamente.

Pelo texto, também passa a ser competência do juiz federal da Justiça Militar julgar habeas corpus, habeas data e mandado de segurança, referente a matéria criminal, impetrado contra ato de autoridade militar. Excetuam-se dessa regra apenas os atos praticados pelos oficiais-generais, que continuam na alçada do Superior Tribunal Militar.

A organização da corregedoria na Justiça Militar também muda. As atividades de orientação judiciário-administrativa, fiscalização e inspeção das auditorias passam a ser exercidas por um ministro-corregedor, cargo a ser ocupado pelo vice-presidente do Superior Tribunal Militar. Hoje essas tarefas ficam a cargo de um juiz de primeira instância.

A proposta recebeu parecer favorável do relator, deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP).

“Destacamos que o Diagnóstico da Justiça Militar Federal e Estadual, produzido pelo Conselho Nacional de Justiça em 2014, concluiu que a existência da Justiça Militar como um ramo especializado do Poder Judiciário Brasileiro é essencial e indispensável para a manutenção do Estado Democrático de Direito, recomendando que as estruturas da Justiça Militar da União e das Justiças Militares estaduais sejam ‘aprimoradas, preservando-se sua constituição essencial original”, disse.

Veja a íntegra do relatório que aprovou o Projeto de Lei 7.683/2014

A Auditoria de Fortaleza, 10ª Circunscrição Judiciária Militar (CJM), passou a utilizar, nesta quarta-feira (21), o processo judicial por meio eletrônico (e-Proc/JMU).

Este é o segundo órgão da Justiça Militar da União (JMU), sediado fora de Brasília, a implantar a tecnologia.

A cerimônia de inauguração ocorreu por meio de videoconferência.

Em Brasília, estava o ministro-presidente do STM, José Coêlho Ferreira; e, na sede daquela auditoria, estavam os juízes-auditores da 10ª CJM, o juiz-auxiliar da presidência, integrantes do Ministério Público Militar e Defensoria Pública, Conselho Permanente de Justiça e servidores da Auditoria e STM que trabalham na implantação.

O ministro-presidente novamente destacou as características de eficiência e economia do sistema.

“São novas perspectivas na tramitação e julgamento de processos, na forma de trabalhar dos magistrados e servidores, que será muito mais eficiente e racional, na economia do emprego do dinheiro público, que sai de nossos bolsos quando pagamos impostos, reduzindo gastos absurdos com papel e outros insumos”.

José Coêlho Ferreira reconheceu ainda que “a vinda do e-Proc/JMU exigirá novas aprendizagens, algumas adaptações na execução de nossos processos e rotinas de trabalho, um abrir-se para o novo”. E completou: “É a oportunidade de sair da zona de conforto para evoluir!”.

O juiz-auditor Celso Vieira de Souza, titular da 10ª CJM, expressou a importância do sistema na atual conjuntura social do País.

“Neste momento em que o Brasil enfrenta uma crise na segurança, em que as Forças Armadas estão sendo muito demandadas, então é muito possível que a nossa demanda aumente. Todos acompanham na mídia a intervenção na área da segurança pública no Rio de Janeiro. A Justiça Militar e as instituições que estão vinculadas ao sistema judicial do processo penal militar devem estar aptas a responder às demandas com celeridade”, afirmou.

Segundo o cronograma, toda a JMU estará trabalhando, até o dia 29 de junho deste ano, por meio do e-Proc.

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“A mulher na ordem jurídica brasileira” foi tema de painel do Curso de Formação para fins de Vitaliciamento de Magistrados da Justiça Militar da União de 2018, apresentado nesta terça-feira (20), no Superior Tribunal Militar (STM).

A ministra do STM Maria Elizabeth Rocha, a juíza titular do Juizado de Violência Doméstica e Familiar de São Sebastião (DF), Rejane Suxberger, e a professora de Direito Fernanda Lage abordaram diferentes aspectos do assunto em suas participações.

O Curso de Formação é promovido pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados da Justiça Militar da União (ENAJUM), e acontece no período de 19 a 23 de fevereiro.

Lei Maria da Penha

A ministra Maria Elizabeth Rocha falou sobre a conquista dos direitos da mulher, traçando um histórico da legislação constitucional e infraconstitucional do tema no ordenamento pátrio, citando também os tratados internacionais de direitos humanos.

Ela considera que as medidas legislativas que vêm sendo adotadas, tanto interna quanto externamente, em favor das mulheres são conquistas das sociedades como um todo. Nesse contexto, a magistrada destacou a Lei 11.340/2006.

“Efetivamente, foi a Lei Maria da Penha que fez emergir na nossa normatividade jurídica uma nova modalidade de política criminal: aquela que visa defender a mulher das agressões sofridas no ambiente familiar com rigor maior do que até então previsto”.

Maria Elizabeth relembrou que a lei emergiu de relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre a violência contra a mulher no seio familiar no Brasil.

“Como consequência da promulgação da lei, se afastou a vil política despenalizadora que balizava processos dessa natureza a tal ponto de se converterem as penas em multa ou pagamento de cestas básicas”, ressaltou a ministra.

Legítima defesa da honra

A juíza titular do Juizado de Violência Doméstica e Familiar de São Sebastião (DF), Rejane Suxberger, também fez um breve apanhado da legislação brasileira sobre a mulher, destacando que apesar de avanços, o espaço da mulher ainda continua reduzido tanto no aspecto profissional quanto social.

“Quando vamos estudar a legislação, vemos que isso acontece desde sempre”, afirmou a magistrada, citando o código filipino, que vigeu na época colonial de 1532 a 1822, no qual, por exemplo, a mulher era considerada como propriedade do homem e poderia ser morta em caso de suspeita de adultério.

Ela ressaltou que esse tipo de situação perdurou até 1830, quando um novo Código Penal promoveu mudanças: “Passou a ser proibido matar a mulher, desde que não houvesse traição. Se houvesse, a pena era atenuada”, afirmou.

A magistrada destacou que essa questão da legítima defesa da honra ainda é citada nas salas de audiência pelos homens como justificativa para a violência doméstica.

“Ouço todas as tardes homens justificando a violência com a traição da mulher, suspeita de adultério, ela ter ficado no bar com as amigas até mais tarde, ou uma mensagem no celular. Existe uma defesa em torno da honra, que é inabalável e que é atingida pela mulher”, afirmou.

A juíza destacou que, até 2005, existiu a figura da mulher honesta no Código Civil. “Tal figura saiu da legislação, mas permanece nas salas de audiência. A mulher que merece proteção é a recatada, a delicada, a que obedece aos requisitos de feminilidade”.

A magistrada então fez a pergunta: como os tribunais estão julgando a violência contra a mulher? Ela citou um trecho de um acórdão de 2016 em que o desembargador considerou como mera perturbação à tranquilidade o fato de um marceneiro ter passado a mão nos seios e nos órgãos genitais de uma menina de 13 anos quando foi instalar móveis na casa da vítima.

Outro aspecto abordado pela palestrante foi o da mulher infratora. A magistrada considera que também nesse aspecto, a mulher é vítima de violência institucional, já que o sistema punitivo foi feito por homens para homens. “O sistema carcerário não foi feito para receber mulheres. Não se defende aqui a falta de punição, mas sim que o sistema prisional esteja preparado para receber mulheres”.

Novo modelo de Estado

Já a professora de Direito Fernanda Lage abordou o tema da igualdade de gênero sob a luz da teoria política e questionou: “O Estado brasileiro garante a igualdade? O que uma mulher é efetivamente capaz de ser e de fazer hoje”?

A pesquisadora defendeu que o Estado deve perceber quais são as desigualdades que impedem a mulher de progredir e de ocupar o espaço que deseja ter na sociedade.

“É preciso que se construa uma nova teoria social e política à luz dessas desigualdades. Ver a mulher não apenas como uma vulnerável, mas como uma agente de mudanças. É necessário também que a mulheres se engajem mais e tenham mais abertura para desenvolver suas capacidades. Mas para que elas sejam agentes, o Estado tem que cumprir alguns requisitos”, alertou.

Para Fernanda Lage, o Estado deve garantir condições de igualdade e os meios efetivos para que a mulher alcance aquilo que ela deseja. Por exemplo, garantir creches para filhos, acesso à escola e à universidade. São necessárias políticas efetivas e reais de acesso para que as mulheres possam concretizar os seus planos. Ela defende maior participação de mulheres em cargos de direção, na vida acadêmica, na política e no mundo jurídico.

Assista às palestras aqui.

 

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