Qual foi a intenção de sua visita hoje ao STM?

Belisário dos Santos: A intenção foi ouvir a ministra Maria Elizabeth. E o que nós ouvimos foi o STM colocando uma riqueza de documentação, de processos e uma riqueza de áudios à disposição da sociedade civil. O STM, para nós advogados que atuamos no período da ditadura civil-militar, era quase que um espaço de esperança.

A primeira instância da Justiça Militar, evidentemente com exceções, era o lugar em que as forças de segurança exerciam a sua influência. O STM era um espaço de Justiça. Às vezes, não a Justiça que queríamos, mas entendíamos as decisões, ainda que contrárias.

O STM tem muitas histórias e essas histórias estão hoje sendo divulgadas pelos advogados que militaram na época: Luís Eduardo Greenhalg, José Carlos Dias, e tantos outros. Eu mesmo tenho histórias de denúncias de tortura em São Paulo, em que os juízes mandavam cópia da denúncia – ao invés de apurá-la – para os órgãos de segurança, o que equivalia a pedir a prisão daqueles advogados que haviam denunciado a tortura.

O STM, depois de uma sustentação do Heleno Fragoso, repreendeu os juízes. “Censurou” foi a expressão usada pelo ministro Nelson Sampaio. Ele censurou os juízes por aquela conduta.

Em uma sustentação oral, Heleno Fragoso dizia que em São Paulo o terrorista era a Justiça Militar. Episódios como esse mostram uma situação de intransigência, de injustiça ou de arbitrariedade cometida em primeira instância, que era corrigida, individualmente, pelos ministros no STM.

Gostaria de mencionar um episódio em que o ministro do STM, que depois se tornou vice-presidente da República, Adalberto Pereira dos Santos, corrigiu uma injustiça em minutos. Esse nome eu pronuncio com extremo respeito, como pronuncio o nome de inúmeros ministros do STM por suas boas sentenças, por suas sentenças com justiça, pelo seu acolhimento a denúncias de torturas.

Esse é um momento muito gratificante para nós saber que no futuro espaço do Memorial da Justiça - que será exatamente no espaço da Justiça Militar em São Paulo, de iniciativa da OAB e de ex-presos políticos - contaremos com documentos e áudios fornecidos pelo STM, instituição que pelo seu presente e, também pelo seu passado, merece extraordinário respeito dos advogados que aqui militaram.

Que importância tem para a sociedade brasileira a abertura de documentos, processos e áudios históricos?

Belisário dos Santos: Não dá para descrever a importância de divulgar discussões da Corte mais antiga do Brasil. São documentos e áudios de sessões secretas em um período importante - de 1975 a 1985 - em que seguramente aparecerão divergências, pensamentos, situações, correções de rumo na jurisprudência.

É como se nós abríssemos uma cápsula do tempo e um dado nunca antes pesquisado, até pela natureza do Tribunal, de agora para frente fica aberto ao público. Isso será revertido seguramente em várias consequências: uma delas é o aumento do respeito – gozado pela Corte – uma decisão de transparência desse tipo, de cidadania e de fornecimento de elementos para a correta compreensão da história valorizará, claramente, a presidente, os seus integrantes e o próprio Tribunal.

Qual é a importância para a sociedade brasileira dos projetos “JMU na História” e “Vozes da Defesa”?

Luiz Eduardo Greenhalgh:  O mais importante é que se trata de iniciativa do próprio STM. É a presidente ministra Elizabeth que está tomando, em nome da Corte, a dianteira no sentido de abrir os arquivos da Justiça mais antiga do Brasil, que é a Justiça Militar.

 

Serão abertos os arquivos do Brasil Colônia, do Primeiro Império, do Segundo Império, da Proclamação da República, da luta dos tenentes, até os dias de hoje, passando ainda pelo Regime Militar de 1964 a 1985.

 

Para os advogados que atuaram na defesa de presos políticos no regime militar essa divulgação é muito importante, porque aqui se chorava, aqui se denunciava, aqui se falava o que acontecia com nossos clientes nos boicotes e eu tenho muita curiosidade de saber qual era a reação dos ministros nas sessões secretas das denúncias que fazíamos.

 

Aqui eu aprendi muito. Não é verdade que o STM tenha sido uma Corte de exceção. Muitos dos seus ministros tinham propósitos garantistas, ações de retificação, sentiam-se constrangidos pelo que os advogados falavam sobre o que tinha acontecido aos nossos clientes na primeira instância.

  

É verdade que havia ministros muito conservadores, adeptos indiscutíveis, incondicionais do regime militar, mas também havia aqueles que começaram incondicionalmente na defesa do regime militar mas, diante das denúncias que fazíamos, foram abrindo os olhos, foram descortinando os seus horizontes e passaram a ser ministros garantistas.

 

Eu me lembro de vários momentos aqui no STM em que eu fazia denúncias. O que queríamos era que o STM mandasse apurar as denúncias e nós conseguimos muitas vezes.

 

Há alguma situação como essa que o senhor acabou de descrever que foi mais marcante?

 

Greenhalgh: Lembro-me de um episódio. Minha família é de militares. Eu tenho um antepassado que foi herói na Batalha do Riachuelo. O Guarda-Marinha nº 1 no Brasil recebe, até hoje, a medalha João Guilherme Greenhalgh.

 

E um dia eu vim aqui, fiz uma sustentação oral no caso do Aldo Arantes, da chacina da Lapa do PC do B. E contei a tortura sofrida por Aldo Arantes.  Depois que eu encerrei, o Tribunal entrou em recesso, fecharam-se as portas e uns 15 minutos depois um marinheiro disse que o ministro Júlio Bierrenbach queria falar comigo.

 

Fui ao seu gabinete e lá ele me perguntou “Doutor Greenhalgh, o que o senhor é do guarda-marinha?”, Respondi que era sobrinho-bisneto. Ele falou: “E o que o senhor está fazendo defendendo um subversivo?”. Eu disse a ele: “Eu estou defendendo cidadãos brasileiros, ministro”. Ele perguntou: “E aquilo que o senhor falou do Aldo Arantes é verdade? Ele foi mesmo torturado?”. Disse que sim. “Palavra de um Greenhalg?”, indagou o ministro.  “Palavra de um Greenhalg”, afirmei.

 

Ele voltou para a sessão e determinou a abertura de um inquérito para apurar as torturas que eu havia denunciado da tribuna. Esses são fatos memoráveis que, agora, com a divulgação desses documentos se tornarão públicos.

 

A história se reescreverá, escute o que eu estou lhe dizendo. A divulgação desses documentos completará a nova escrituração da verdade sobre o regime militar.

 

O senhor se emocionou ao ouvir, por alguns segundos, alguns áudios daquela época.

 

Greenhalgh: Vamos vivendo um pouco do passado. É trazer o passado para o presente. Naquela época, eram poucos os advogados que aceitavam vir aqui defender presos políticos, combater a Lei de Segurança Nacional, defender os direitos humanos.

 

Eram poucos. Lá em São Paulo se contava nos dedos. No Brasil, acho que não chegava a cinquenta o número de advogados que enfrentavam a Lei de Segurança Nacional nos tribunais militares.

 

Nós sofríamos, fomos perseguidos. O meu escritório foi baleado em São Paulo. O Belisário teve seu escritório arrostado e invadido por tropas do DOI-CODI.  Cada um de nós sofreu, naquela época, um tipo de perseguição. Fiquei realmente muito emocionado ao ouvir uma sessão secreta. E não vejo a hora de ter acesso a esses áudios.

O ministro do Superior Tribunal Militar José Barroso Filho foi o entrevistado da edição 173 da Revista Justiça e Cidadania. Entre os assuntos abordados, o magistrado traz esclarecimento sobre o fenômeno da “hiperlitigiosidade”, mostrando números e motivos para que sejam estimuladas as formas de solução extrajudicial de conflitos, além de relatar suas bem-sucedidas experiências no inicio da década de 1990, quando exercia a magistratura estadual em Pernambuco.

O ministro do STM também destaca os caminhos que o Poder Judiciário pode seguir para equilibrar dois atributos distintos: o acesso à Justiça, garantido na Constituição Federal, e a desejada celeridade frente ao excessivo número de demandas. A questão da redução da maioridade penal; os índices crescentes de violência entre jovens; a governança judiciária; e a relação entre Justiça, Democracia, Desenvolvimento e Cidadania também são temas desta entrevista.

Leia a entrevista na íntegra.

José Barroso Filho tornou-se ministro do Superior Tribunal Militar em abril do ano passado credenciado por currículos acadêmico e profissional dos mais ecléticos.

Com cursos de pós graduação em Direito Econômico e em Administração Público, além de uma graduação na Escola Superior de Guerra, ele foi promotor de Justiça na Bahia, juiz de Direito em Minas Gerais e Pernambuco e juiz auditor da Justiça Militar em metade dos estados brasileiros.

Antes de chegar ao STM, passou ainda pelo Conselho Nacional de Justiça, como juiz auxiliar da presidência, na gestão da ministra Ellen Gracie. Antes ainda, foi assessor do Ministério da Defesa.

Por isso, o ministro da Justiça Militar se sente à vontade para falar dos mais variados temas e, com frequência, invoca sua experiência pessoal para reforçar suas teses. É o que faz quando aponta a ouvidoria de empresas e órgãos públicos como um forte indutor para a solução alternativa de conflitos.

Designado ouvidor do Supremo Tribunal Militar, ele fez o curso de ouvidor, certificado pela Associação Brasileira de Ouvidores/Ombudsman. “O objetivo é fazer da Ouvidoria do Superior Tribunal Militar um canal de comunicação com a sociedade com base na transparência, ética e comprometimento com o aperfeiçoamento dos serviços prestados pela Justiça militar”, diz.

Em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico, sustenta que o sistema judicial brasileiro está praticamente no limite de sua capacidade para atender a grande demanda criada a partir da Constituição de 1988.

Sem pensar em restringir o acesso ao Judiciário, ele defende o estímulo aos meios alternativos de solução de conflito para desafogar o sistema: "Ter acesso à justiça não significa ter acesso ao Judiciário", diz ele.

 

Leia a íntegra da entrevista no Consultor Jurídico 

 

Advogado criminalista e jurista Técio Lins e Silva

Durante visita ao STM em que foi firmada uma parceria para a digitalização de áudios das sessões secretas da época do regime militar, o presidente do Instituto Brasileiro de Advogados Técio Lins e Silva concedeu entrevista em que relembra a sua trajetória como um dos mais efusivos advogados que atuaram na primeira instância da Justiça Militar da União e no Superior Tribunal Militar.

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