O Superior Tribunal Militar (STM) recebeu denúncia contra um ex-sargento do Exército e sua esposa, após o julgamento de um Recurso em Sentido Estrito, impetrado pelo Ministério Público Militar (MPM).

Os dois acusados foram denunciados pelo MPM, que acredita que ambos tenham incorrido no crime de estelionato, artigo 251 do Código Penal Militar (CPM). O casal teria planejado uma fraude com o objetivo de fazer a Administração Militar considerar o sargento como morto ficto.

A morte ficta ou presumida, de forma geral, é declarada quando a pessoa desaparece sem deixar procurador. Não existe uma certeza da morte, apenas a suspeita. No caso em questão, a unidade militar em que o ex-sargento servia declarou a sua morte ficta após um ano do seu desaparecimento com o objetivo de resguardar os direitos da esposa, que, neste caso, é considerada viúva e que teria direito ao recebimento da pensão.

Deserção e pensão militar

De acordo com o MPM, a farsa começou ainda em 1996, quando o sargento saiu de férias e não retornou, sendo considerado desertor. Um ano após o fato, a mulher do sargento solicitou habilitação à concessão de pensão militar, que lhe foi deferida dois meses depois, quando ela passou a receber os respectivos proventos depositados pelo Exército.

Consta ainda na peça acusatória apresentada pelo MPM que a deserção foi premeditada, uma vez que o militar tinha conhecimento de que sua ausência por um período prolongado causaria a declaração da chamada "morte ficta", o que daria à mulher dele o direito a receber a pensão na condição de viúva.

Todo o caso foi descoberto quando o próprio sargento se apresentou à Administração Militar, nove anos depois, acreditando que o crime já estaria prescrito, o que motivou a deflagração do processo investigatório e posterior oferecimento de denúncia.

Para o MPM, vários são os sinais de que a deserção foi intencional e em comum acordo com a outra denunciada, a esposa do ex-militar.

Segundo o MPM, um dos primeiros indícios é o fato de que durante muitos anos o militar exerceu função de auxiliar de análise de processo na Seção de Inativos e Pensionistas (SIP), na unidade militar em que trabalhava, o que fazia com que ele soubesse exatamente quais os trâmites em caso de uma ausência prolongada.

Além disso, o MPM apurou que durante os nove anos em que o sargento esteve na qualidade de desertor, ele e a esposa não só mantiveram contato, como abriram uma empresa em sociedade.

No total, durante todo o período em que durou a ausência do denunciado, sua esposa recebeu, a título de pensão, quase R$ 1 milhão, dinheiro que o MPM entende pago indevidamente, configurando o crime de estelionato.

Argumentos defensivos

No STM, a Defensoria Pública da União (DPU) sustentou que ambos os acusados foram erroneamente inquiridos como testemunhas de defesa durante Inquérito Policial Militar (IPM).

Da mesma forma, alegou que não houve indução que acarretasse o erro por parte da Administração Militar, não constando dos autos nenhum documento ou relato de suspeita de apresentação de documento falso.

Sustentou também que o MPM não se incumbiu de demonstrar a tipicidade formal do delito e que os elementos de convicção eram deficientes. A DPU argumentou ainda que a investigação não foi aprofundada do ponto de vista jurídico e legal no momento da concessão do benefício de pensão para a indiciada, sendo impositiva a manutenção da decisão que rejeitou a denúncia.

Justificativa para rejeição

O juiz federal da Justiça Militar, responsável pela rejeição da denúncia na primeira instância, explicou que a Administração Militar acolhia a exclusão por deserção como causa para concessão de pensão na forma da Lei nº 3.765/60, conforme procedimento de habilitação.

“Na verdade, ao meu sentir, os acusados se valeram de posicionamento administrativo, tendo a denunciada simplesmente requerido a habilitação e a concessão de pensão, sem apresentar dado ou documento falso, nem gerar ou manter a Administração em erro. Cabe registrar que tudo teve início com a exclusão de um militar estável por deserção, contrariando o Código de Processo Penal Militar, que prevê a agregação nesses casos”, explicou o magistrado.

O juiz continuou a fundamentação demonstrando que a exclusão por deserção jamais poderia ter gerado a denominada morte ficta, na forma da Lei nº 3.765/60, ao contrário do entendimento da unidade militar em que ele servia.

“A morte ficta deve alcançar tão somente militares expulsos ou excluídos a bem da disciplina. Temos, na verdade, um fato atípico, motivo pelo qual rejeito a denúncia”, decidiu o magistrado de primeira instância.

Decisão na corte superior

A ministra Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha foi a relatora do Recurso em Sentido Estrito no STM.

Inicialmente, a magistrada decidiu pela retirada dos autos dos depoimentos colhidos dos acusados durante o Inquérito Policial Militar (IPM).

A defesa alegava, e a ministra concordou, que as provas violaram preceitos fundamentais dos acusados, uma vez que, na ocasião, foram interrogados como testemunha, não sendo a eles facultado o direito ao silêncio.

No mérito da questão, no entanto, a magistrada entendeu que na atual fase processual deve prevalecer o in dubio pro societate.

“A instrução processual é direito subjetivo outorgado ao dono da ação quando satisfeitas as exigências legais. Impedir seu exercício de forma precoce frustra as prerrogativas do MPM, pois o impossibilita de exercer sua função", afirmou a ministra.

"Por isso, diante da existência de lastro probatório mínimo e não se evidenciando patente atipicidade da conduta, tampouco provas cabais a afastar a autoria, reconheço existir justa causa apta a deflagrar a ação penal, devendo a peça ser recebida”, decidiu Maria Elizabeth Rocha, que deu provimento ao recurso do Ministério Público e determinou a baixa dos autos à primeira instância, local em que o feito deverá prosseguir. Os ministros do STM acolheram o voto da magistrada, por unanimidade. 

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 7000870-69.2019.7.00.0000

A sessão de julgamento foi transmitida ao vivo

O Superior Tribunal Militar (STM) recebeu denúncia de estelionato contra um ex-soldado do Exército acusado de simular incapacidade física com o objetivo de obter a condição de "reformado" e receber o benefício previdenciário.

A reforma corresponde a um afastamento do militar decorrente de incapacidade definitiva para o serviço.

De acordo com a denúncia, o então soldado teria sido aposentado e recebido, indevidamente, proventos de reforma do Exército brasileiro.

Apesar de o benefício ter sido concedido com base em decisão judicial de primeira instância, posteriormente a sua condição de reformado foi cassada pelo Tribunal Regional Federal de Porto Alegre.

Em 2005, a Justiça Federal de Porto Alegre julgou procedente o pedido formulado pelo então ex-militar, para sair da condição de licenciado – estava desligado do Exército desde 2000 –, e passar para a reforma, por “incapacidade permanente para o serviço militar e para atos laborativos da vida civil”.

Em 2006, a sentença foi confirmada em acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Na ação ganha na justiça federal, o homem argumentava que havia sofrido acidente de serviço em 29 de abril de 1999, durante atividade de educação física dentro do quartel do 22º Grupo de Artilharia de Campanha (22º GAC), sediado em Uruguaiana, extremo sul do Rio Grande do Sul, na divisa com o Uruguai, que o impediu de exercer qualquer atividade física com os seus membros inferiores, resultando em incapacidade definitiva para o serviço.

Ação rescisória

Nove anos depois, em 2014, o acórdão que reconhecia o benefício foi cassado por meio de Ação Rescisória concedida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Na ação, o Tribunal decidiu desconstituir decisão anterior da própria Corte, a qual entendia ter o militar direito à reforma.

“A despeito de a perícia judicial, realizada na ação originária, ter apurado que, naquele momento, o militar era incapaz para o desempenho de atividade laboral, em especial para as que demandassem esforço físico, antes do trânsito em julgado, ele graduou-se em Direito e em 2008, após o registro profissional na OAB, iniciou o exercício da advocacia”, postulou o Plenário da corte.

O Tribunal concluiu que, ao desconsiderar que o réu atuava como advogado desde 2008 e conceder-lhe a reforma militar, o acórdão anterior havia incorrido em violação ao Estatuto dos Militares (Lei nº 6.880/80).

Com base nesse novo entendimento, o Ministério Público Federal, com sede do Rio Grande do sul, ofereceu denúncia contra o beneficiário da reforma, atribuindo-lhe a conduta de estelionato sob o argumento de que o então militar vinha obtendo para si, desde o ano de 2005, vantagem ilícita “mediante indução e manutenção em erro da União Federal”, causando um prejuízo à União.

A denúncia ainda relatou que os autos do Inquérito Policial elaborado pela Polícia Federal revelaram que o denunciado não possui qualquer incapacidade e que identificou-se que o denunciado faz “musculação em aparelhos, tanto para braços quanto para as pernas, com pesos de musculação muito elevados, sendo visível não se tratar de situação de realização de fisioterapia.”

Processo na Justiça Militar

Em 2012, a Justiça Federal declinou da competência e determinou a remessa do feito à Justiça Militar da União (JMU).

No entanto, após oferecimento de denúncia à primeira instância da JMU em Bagé, o juízo militar decidiu pelo não recebimento da denúncia, por entender que “não se pode reconhecer a existência de fraude, muito menos, do recebimento indevido em prejuízo do Exército”.

A decisão se baseou no fato de que a ação rescisória deu parcial provimento à apelação para afastar a reforma do interessado, garantindo, todavia, a sua reintegração até sua inscrição na OAB, em 2008. Além disso, o órgão pôs em dúvida a existência de fraude ou de tipificação da conduta que viabilizasse a ação penal.

No Superior Tribunal Militar

Ao analisar Recurso em Sentido Estrito proposto pelo Ministério Público Militar contra a decisão do juízo militar de primeiro grau, o Superior Tribunal Militar entendeu que a denúncia deve ser apresentada sempre que houver prova de fato que, em tese, constitua crime e indícios de autoria, conhecido como Princípio da Obrigatoriedade.

O relator da ação no STM, ministro Cleonilson Nicácio Silva, lembrou em seu voto que o que está sendo questionado é o recebimento do benefício de julho de 2010 – quando da concessão da reforma – até janeiro de 2015, sendo que a soma dos valores recebidos chegam a mais de R$ 160 mil.

“A conduta delituosa foi minuciosamente descrita na peça acusatória, revestindo-se, pois, das formalidades legais exigidas pela norma processual penal castrense, não sendo possível vislumbrar, em preliminar análise, própria dessa fase, que esteja acobertada pelo manto da atipicidade ou por excludentes de ilicitude, tornando-se imperiosa a dilação probatória com vistas a permitir que o Ministério Público Militar exerça o seu mister constitucional na busca das provas da imputação contida na Exordial”, afirmou o relator.

O Plenário do Tribunal seguiu o voto do relator, por unanimidade, no sentido de receber a denúncia e determinar o prosseguimento do feito na primeira instância da Justiça Militar Federal.

A primeira instância da Justiça Militar da União em Fortaleza não recebeu denúncia contra cinco acusados de furtar quase 200 pares de tênis doados pela Receita Federal à Escola de Aprendizes-Marinheiros do Ceará. O Ministério Público Militar recorreu ao STM, que recebeu a denúncia contra os militares.

O encontro com a presidente do STM, ministra Maria Elizabeth Rocha, está marcado para as 17h30 e tem como pauta a assinatura de termo de cooperação para pesquisas nos arquivos do STM, principalmente os referentes aos processos julgados durante o regime militar.

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