A presidente do Superior Tribunal Militar (STM), ministra Maria Elizabeth Rocha, proferiu nesta segunda-feira (9/6) a aula inaugural do Curso de Capacitação com Foco na Atuação com Perspectiva de Gênero, promovido pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). O evento, realizado na capital mineira, tem como objetivo qualificar a atuação de promotores no enfrentamento ao feminicídio e à violência baseada em gênero.
Convidada pelo procurador-geral de Justiça do MPMG, Paulo de Tarso Morais Filho, a ministra destacou em sua palestra que o sistema de Justiça brasileiro deve assumir sua responsabilidade na contenção de práticas discriminatórias e abusos cometidos sob o argumento da neutralidade institucional. “O Direito é, em si, antidiscriminatório, pois detém em sua base o princípio da dignidade humana”, afirmou.
Durante a exposição, Maria Elizabeth alertou para os riscos do uso de estereótipos de gênero, raça e etnia em peças processuais, audiências e julgamentos, o que, segundo ela, compromete a imparcialidade e propaga violações disfarçadas de legalidade. “A utilização de estereótipos traça uma problemática urgente a ser enfrentada por todo o sistema: a ocorrência da discriminação a contaminar as Políticas de Estado”, pontuou.
A ministra também destacou a importância da Resolução nº 492/2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que institui o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, Raça e Etnia. Como integrante da Justiça Militar, ela participou da construção da norma, que orienta o Judiciário a considerar as interseccionalidades nas decisões judiciais. “Não se olvida que o processo pode majorar e propagar violências, ainda que banalizadas, sob o argumento de uma ampla defesa e contraditório irrestrito, com cegueiras institucionais”, criticou.
Maria Elizabeth citou episódios recentes que levaram à criação de legislações específicas, como a Lei 14.245/2021 — conhecida como Lei Mariana Ferrer —, e reforçou que, embora a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) tenha representado um marco no combate à violência contra a mulher, o Brasil ainda está distante de alcançar a equidade no tratamento processual de vítimas.
“A coação no curso do processo, a litigância abusiva, o uso de termos injuriosos e degradantes devem gerar responsabilidades. Abusos não estão acobertados pela esfera do exercício regular de um direito”, destacou a ministra.
A presidente do STM concluiu sua participação anunciando ações institucionais para a promoção da equidade na Justiça Militar. Entre elas, o Observatório Pró-Equidade, que atua no aprimoramento da gestão inclusiva do tribunal. A iniciativa abrange a valorização da diversidade em editais, ações formativas em direitos humanos, reflexões sobre práticas processuais e promoção de diálogo interinstitucional.
“Reconhecemos a equidade como um valor constitucionalmente exigido. Cabe a nós, operadores do Direito, garantir que o acesso à Justiça seja efetivo, digno e livre de discriminação para todos e todas”, finalizou.