“O que é bom para as crianças, é bom para toda a sociedade”. Foi com esse tradicional ditado que a especialista em direito da criança e membro da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, Rosa María Carolina Ortiz Carrón, deu início à palestra de hoje (10), intitulada “Os direitos dos meninos, das meninas e dos adolescentes no contexto da violência armada”.

A especialista afirmou existir um estigma contra os adolescentes na sociedade contemporânea, pois os adultos têm dificuldades em entender o que é ser um adolescente. Usualmente, a repressão é a primeira resposta para o jovem infrator e as políticas públicas se centram neste caráter repressor com a elaboração de políticas de curto prazo que buscam soluções rápidas para uma violência estruturalmente problemática. Rosa Carrón indicou o debate acerca da redução da maioridade penal, presente atualmente na pauta de várias nações, como exemplo de soluções ineficazes que acabam por gerar mais violência, agravando a crise do sistema carcerário e a saturação do sistema judicial.

Carrón revelou que a situação das crianças nas Américas é grave. “Esta região é a mais violenta do mundo para as crianças”. Para a especialista, a causa desse problema é a desigual distribuição da violência nos países, estando ela concentrada nas grandes cidades, onde há uma baixa presença do Estado. De acordo com dados apresentados por Carrón, o contexto de exclusão social faz com que mais da metade das vítimas de homicídios no Brasil sejam jovens afro-brasileiros em situação de pobreza.

A palestrante afirmou que a Comissão Interamericana identificou a percepção social amplamente compartilhada de que os adolescentes e jovens são os principais causadores da violência. “Crianças do sexo masculino, pobres e socialmente excluídos são percebidos como perigo social e se atribui a eles o problema da falta de segurança. Assim, surge o debate sobre a diminuição da idade penal e endurecimento das penas contra esses jovens”, ressaltou Carrón.

Forças Armadas na segurança pública

De acordo com Rosa Carrón, a Comissão Interamericana defende que as Forças Armadas não deveriam participar de tarefas de segurança pública.  Isso porque “o treinamento, a organização institucional, os equipamentos preparam as forças militares para o combate e a derrota do inimigo”.

A especialista informou que foram encaminhadas à Comissão informações sobre a Polícia Militar brasileira e as Forças Pacificadoras. Segundo ela, a ausência de investigação adequada e a atuação de grupos de extermínio que executam extrajudicialmente grupos de pessoas consideradas culpadas pela violência em determinadas comunidades são algumas das reclamações enviadas à Comissão.

Rosa Carrón concluiu a palestra orientando a melhor forma de se enfrentar o problema do crime organizado e a insegurança decorrente dele: as medidas públicas devem encarar o tema de forma holística e a superação da desigualdade e da exclusão social deve ser perseguida. “A Comissão considera que a falta de acesso a uma grande gama de direitos, junto a uma falta de tolerância social, faz com que haja mais vulnerabilidade de direitos das crianças e adolescentes e a captação desse grupo pelo crime organizado”.  

Palestras na íntegra

Na manhã dessa terça (10), o professor doutor José Félix Palomino Manchego da Universidade de San Marco no Peru também palestrou sobre o tema “A influência das sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos na Jurisdição Militar do Peru”.

A íntegra das palestras em breve estará disponível no canal do STM no Youtube. O Encontro da JMU com a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos vai até quinta-feira (12) e pode ser acompanhado ao vivo pelo canal do STM. 

 

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A primeira palestra do Encontro da Justiça Militar da União com a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos foi ministrada pelo juiz presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Humberto Antonio Sierra Porto.

O palestrante fez um panorama sobre questões que serão discutidas em todos os dias do Encontro, como o alcance da justiça militar na jurisdição da Corte Interamericana e compatibilização entre as decisões judiciais dos países americanos e a Corte.

Segundo o especialista, com a globalização os fenômenos jurídicos também passaram a ser compartilhados, gerando a necessidade de soluções compartilhadas. As fronteiras entre o direito nacional e internacional são cada vez mais difusa. "Os principais atores desse sistema não somos os juízes da Corte Interamericana apenas, mas os juízes e juízas nacionais", disse.

O controle de convencionalidade foi o tema de destaque, que é a compatibilização da produção normativa doméstica com os tratados de direitos humanos ratificados pelo governo e em vigor no país. Humberto Porto afirmou que é responsabilidade essencial dos tribunais nacionais fazer justiça respeitando o direito interno e a jurisdição internacional.

Segundo explicou, todos os decisores públicos devem recorrer às fontes do direito internacional como mais um parâmetro para resolver casos concretos, sem abrir mão das respectivas competências. Trata-se de um controle dinâmico e subsidiário entre as autoridades internas e internacionais, para que as decisões internacionais sobre direitos e liberdades seja preservadas em decisões internas.

Porto afirmou que a soberania dos estados americanos é compatível com o trabalho da Corte Interamericana. Entre as atribuições da Corte, está avaliar decisões dos estados americanos para que estejam em harmonia com o direito internacional.

O palestrante encorajou os participantes a discutirem questões como essas no decorrer do Encontro. E fez um questionamento: “O direito internacional está ligado ao trabalho dos operadores jurídicos: qual o valor das decisões da Corte Interamericana e da Comissão no seu trabalho?”. Além disso, incentivou a busca de soluções práticas para esse desafio.

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O vice-presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), o advogado brasileiro Roberto de Figueiredo Caldas, foi o segundo palestrante a falar no Encontro da Justiça Militar da União com a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Dentre os temas apresentados estão o posicionamento da CIDH quanto ao julgamento de civis pela Justiça Militar, a competência da justiça comum para julgar graves ofensas a direitos humanos e a revisão contínua da legislação militar.

Um dos pontos mais destacados por Roberto Caldas foi a importância do diálogo entre a Corte Interamericana de Direitos Humanos e os sistemas de Justiça de todo o mundo para se colocar em debate os pilares, objetivos e desafios para o futuro, no que tange a interação entre esses sistemas jurídicos. “Certamente esse evento é surpresa para muitos da própria sociedade e deve marcar de simbologia os nossos afazeres: o da Justiça Militar e o da justiça dos direitos humanos. O diálogo é a palavra chave para a Corte em seu diálogo jurisprudencial, que é a constante análise da jurisprudência dos mais altos tribunais”.

Na visão do vice-presidente da CIDH, o diálogo entre a hierarquia militar e os direitos humanos é uma via de mão dupla. “Colocou-se muitas vezes durante a história a contraposição entre Forças Armadas e Direitos Humanos”, destacou Caldas para apontar a relevância da Corte Interamericana de Direitos Humanos como tribunal internacional especializado, estabelecido a partir da ideia do pós-guerra, para que ofensas aos direitos humanos possam ser examinadas com mais frieza e independência sentimental. “No caminho para continuar essa construção de conteúdo é que a Corte Interamericana segue estreitando laços com outras cortes, como o que fazemos aqui hoje no Superior Tribunal Militar”.

Julgamento de Civis

Roberto Caldas dedicou uma parte de sua palestra para abordar o tema do julgamento de civis pelas Justiças Militares. Segundo ele, “a delimitação dessa competência é um dos pontos nevrálgicos para este evento porque aqui temos passos e descompassos nas várias jurisdições e nações”. O vice-presidente da CIDH apontou que, após a Corte analisar profundamente casos concretos divergentes de diversos países e os estandares da Organização das Nações Unidas, se chegou ao estabelecimento normativo de que os civis, mesmo quando praticarem crimes conexos ou aliados a militares, devem ser julgados pela Justiça ordinária. Para ilustrar o tema, Caldas sugeriu o estudo de um caso paradigmático: a sentença de 1999 do caso Castillo Petruzzi contra o estado do Peru.

Ao concluir a sua fala, Caldas lembrou à plateia um importante convênio entre o Ministério da Justiça e o Ministério das Relações Exteriores que resultou na tradução para o português das principais sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos, o que facilita o controle de convencionalidade por parte dos juízes, procuradores e advogados brasileiros. “A convenção americana está acima das leis e seus termos devem ser seguidos, a interpretação de seus dispositivos vai sendo construída diariamente pela Corte e a Comissão. É necessário que todos os órgãos estatais realizem um adequado controle de convencionalidade”. 

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O especialista chileno José Luis Guzmán Dalbora foi um dos palestrantes desse primeiro dia do Encontro da Justiça Militar da União com a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Na palestra intitulada “A prova dos atos de terrorismo à luz dos princípios do processo penal liberal”, Dalbora traçou um paralelo entre o antigo crime de lesa-majestade e o atual crime político de terrorismo para debater o problema do anonimato de testemunhas e a condenação do estado do Chile pela Corte Interamericana no caso Norín Catrimán.

Em 29 de maio de 2014, a Corte Interamericana notificou o estado do Chile por diversas violações à Convenção Americana de Direitos Humanos quando condenou membros do povo indígena Macuche que protestaram pela propriedade de terras ancestrais. De acordo com a sentença, o Estado não respeitou o devido processo legal por utilizar testemunhos anônimos e pela aplicação discriminatória da lei antiterrorista contra aquele povo.

A Corte constatou que, no processo penal que culminou na condenação do povo Macuche, as identidades das testemunhas foram mantidas secretas durante a investigação. A defesa pode interrogá-los, mas os acusados não tinham conhecimento de quem os acusava. No entanto, em observância ao artigo 8º do Pacto San José de Costa Rica, a Corte afirma que o emprego de testemunha anônima deve ser excepcional, observando o princípio de proporcionalidade e apenas quando houver situação de risco para a testemunha.

Em relação à determinação da Corte Interamericana, o palestrante afirmou enxergar um problema e questionou: “Existe verdadeira defesa contra um testemunho anônimo”?  Segundo Dalbora, ao se admitir a acusação anônima, a lei teria menos interesse em encontrar a verdade do que em aplicar a lei. “O processo penal se inclina decididamente para o lado do Ministério Público, é um sinal de que o interesse de castigar prevalece sobre a condição do réu”. Para o especialista, a paridade entre a defesa e a condenação sai prejudicada nessa situação.

“O civil na Justiça Militar Chilena” – Para finalizar a tarde do primeiro dia de palestras, o General-de-Brigada e Auditor-Geral do Exército chileno, Waldo Martínez Cáceres, falou sobre a situação do civil na Justiça Militar do Chile sob a ótica das mudanças sugeridas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos para que seja retirada da competência dessa Justiça especializada o julgamento de civis, mantendo-se apenas os militares da ativa como seus jurisdicionados.

As palestras do Encontro da Justiça Militar da União com a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos poderão ser revistas na íntegra no canal do STM no Youtube. 

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