14/08/2025

STM mantém competência para julgar coronel da reserva acusado de incitar quebra de hierarquia militar

O plenário do Superior Tribunal Militar (STM) decidiu, por unanimidade, que a própria Justiça Militar da União deve processar e julgar um coronel da reserva do Exército, acusado de incitar a quebra de hierarquia e disciplina e de ofender a dignidade das Forças Armadas em publicações nas redes sociais.

A decisão reformou entendimento da Auditoria da 4ª Circunscrição Judiciária Militar (CJM-MG), que havia remetido o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF) por suposta ligação dos fatos aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023.

Para o STM, como os atos cometidos pelo militar ocorreram após janeiro de 2023, não há, portanto, ligação com a ação penal em curso no STF.

O oficial, atualmente vinculado à Seção de Veteranos e Pensionistas da 4ª Região Militar, em Juiz de Fora (MG), é réu em ação penal militar por incitamento (art. 155 do Código Penal Militar), ofensa às Forças Armadas (art. 219) e difamação (art. 215).

Segundo a denúncia do Ministério Público Militar (MPM), a partir de janeiro de 2023, o coronel da reserva teria utilizado perfis no Instagram e YouTube, intitulados “Frente Ampla Patriótica”, para veicular vídeos e mensagens que incentivavam a desobediência de militares, sugeriam o rompimento da hierarquia e atacavam diretamente o Comandante do Exército, general Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva.

Em uma das gravações, o coronel sugere que “os manuais militares foram feitos para serem rasgados” e que “situações de não-normalidade” justificariam a quebra de disciplina. Em outra, conclamou militares da ativa e da reserva a não comparecerem ao Dia do Veterano, como forma de protesto contra o Alto Comando, que acusou de “covardia e omissão” após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Também chegou a afirmar que as Forças Armadas “traíram o povo brasileiro” e que poderia haver um “capitanismo” ou “coronelismo” semelhante ao movimento tenentista de 1930.

Ao denunciar o coronel à Justiça Militar, o MPM sustentou que as manifestações extrapolaram a liberdade de expressão, pois teriam o objetivo de minar a disciplina militar e atingir a honra do Comandante do Exército. Para a acusação, as falas atentam contra valores estruturantes da instituição castrense, previstos no art. 142 da Constituição.

Mas o juízo de primeiro grau declinou da competência do caso em favor do Supremo Tribunal Federal, por entender que havia relação com o processo que engloba o caso do atentando contra a democracia, sob relatoria do ministro Alexandre de Morais. A defesa, no entanto, recorreu contra a decisão de primeira instância junto ao STM, argumentando que os fatos não guardam relação direta com os eventos de 8 de janeiro, ocorridos em Brasília, e que ocorreram posteriormente, configurando crimes militares típicos, cuja apuração cabe à Justiça Militar da União.

Ao apreciar o caso no Superior Tribunal Militar, o relator, ministro Odilson Sampaio Benzi, acolheu o recurso defensivo. Para ele, não há provas mínimas de que o coronel tenha participado, coordenado ou incentivado as ações do dia 8/1. “Os fatos apurados foram praticados após aquele fatídico dia e, consequentemente, não teria como ele ter influenciado no que aconteceu em data passada”, afirmou.

Benzi também destacou que, diferentemente de precedente citado pelo juízo de origem, no qual as condutas ocorreram durante os ataques aos Três Poderes, neste caso o material probatório aponta apenas para manifestações de inconformismo interno na caserna. “A insatisfação do recorrente está direcionada, internamente, para a própria Força e para os oficiais superiores, não tendo qualquer ligação com os acontecimentos de 8 de janeiro de 2023”, disse.

O relator afastou a tese de que os crimes de ofensa e difamação seriam absorvidos pelo delito de incitamento, ressaltando que teriam sido cometidos em momentos distintos. Também refutou o enquadramento na competência do STF, argumentando que a Suprema Corte tem se limitado a processar crimes ocorridos antes e durante os atos de 8 de janeiro, ou que tenham contribuído para sua execução.

Por unanimidade, o plenário seguiu o voto do relator. Com a decisão, o processo volta a tramitar na Auditoria da 4ª CJM, onde seguirá a instrução criminal contra o coronel da reserva.

Linha do tempo do caso

  • Janeiro de 2023 – Após os atos de 8/1, coronel da reserva publica vídeos e mensagens no Instagram e YouTube, criticando o Comandante do Exército e incentivando a desobediência militar.
  • 2023 – Ministério Público Militar denuncia o oficial por incitamento, ofensa e difamação.
  • 1ª instância (4ª CJM) – Juízo entende que há ligação com 8/1 e remete o caso ao Supremo Tribunal Federal.
  • Defesa – Recorre ao STM, alegando que os fatos ocorreram depois e não têm relação com os ataques em Brasília.
  • Agosto de 2025 – Ministro Odilson Sampaio Benzi vota por manter a competência da Justiça Militar, afirmando que as condutas foram direcionadas à própria Força e não aos eventos antidemocráticos.
  • Decisão final – STM reforma decisão da 1ª instância; processo volta à 4ª CJM para continuidade.

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 7000019-20.2025.7.00.0000

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