O Superior Tribunal Militar (STM), por maioria dos votos dos ministros, mudou entendimento da primeira instância da Justiça Militar da União e condenou um ex-soldado do Exército por homicídio culposo. No primeiro grau, o acusado foi absolvido pelos juízes, por unanimidade, sob fundamento de que não havia provas nos autos suficientes para a condenação.

O episódio ocorreu em 9 de maio de 2018, no Campo de Instrução de Formosa (GO). Segundo a denúncia do Ministério Público Militar (MPM), ao realizar uma instrução de tiros com fuzil, o acusado, até então soldado, atingiu outro soldado, Victor Campos Ferreira, com um tiro na nuca. O exercício estava sob responsabilidade do 1º Batalhão de Ações de Combate (1º BAC), com sede em Goiânia (GO).

Houve imprudência, diz o Ministério Público Militar

Após a absolvição na 1ª Auditoria da 11ª CJM, com sede em Brasília, o MPM impetrou um recurso de apelação junto ao STM, na intenção de reverter a decisão do Conselho Permanente de Justiça (CPJ). Arguiu que a prova testemunhal mostrou-se harmônica ao afirmar que a dinâmica do exercício fora claramente explicada, que os alvos eram apenas os que se encontravam na linha reta final e que os alvos intermediários (no interior da pista) não faziam parte do exercício e deveriam ser ignorados pelo atiradores.

O representante do MPM afirmou, inclusive, que o depoimento do acusado durante o inquérito esclareceu ter sido ele quem efetuou os disparos nos alvos intermediários, antes mesmo de o resultado do laudo pericial mostrar que foi da arma dele que partiu o tiro contra a vítima. “Autoria e a materialidade do delito foram comprovados pelo conjunto probatório juntado aos autos, composto por prova testemunhal, documentos e laudos periciais além do laudo cadavérico" . Para a promotoria, o fato constituiu conduta criminosa, caracterizado como homicídio na forma culposa, por imprudência, pois tanto os instrutores quanto os militares tinham suficiente preparo para conduzirem e participarem do exercício de tiro. 

Inexistência de provas suficientes, afirmou a Defensoria Pública

Por sua vez, a Defensoria Pública da União pediu que fosse julgado improcedente o recurso, mantendo-se a sentença em todos os seus termos, pois não existiam provas suficientes para demonstrar a imprudência do apelado, uma vez que foi encontrada quantidade ínfima de porção de chumbo no crânio da vítima, de onde se pressupõe que a bala tenha ricocheteado e os fragmentos tenham atingido a vítima. A advogada concluiu que deveria ser aplicado o princípio do in dubio pro reo, absolvendo o apelado por falta de provas.

Apelação no STM

Ao apreciar o recurso, o ministro José Coêlho Ferreira votou pela condenação do ex-militar pelo crime de homicídio culposo, previsto no artigo 206 do Código Penal Militar, a um ano de reclusão, em regime aberto, com o benefício da suspensão condicional da execução da pena pelo prazo de dois anos, com a obrigatoriedade de se apresentar, trimestralmente, perante o juízo de execução. Para o ministro, os depoimentos prestados pelas testemunhas e pelo próprio apelado deixaram claro que, antes do exercício de Tiro de Fração, foi realizada explicação teórica (briefing), suficientemente detalhada para a compreensão do exercício.      

Afirmou o magistrado que o depoimento do apelado mostra que não houve dúvidas sobre as instruções transmitidas. “Inclusive, durante o IPM, o apelado afirmou que foi orientado sobre como deveria ser realizada a pista do tiro de fração, não restando dúvida sobre o que deveria ser feito". Para o relator, o acusado confessou que realizou disparos  nos alvos que estavam à sua frente e que não teria identificado outro militar atirando neles. 

Assim, disse o ministro em seu voto: "O resultado naturalístico deve ser previsível, controlável, dominável, ou evitável pela prudência normal. Assim, no presente caso, a meu sentir, o apelado tinha tanto previsibilidade objetiva como subjetiva da possibilidade de que poderia atingir outro militar durante o exercício, a partir do momento em que era realizado com uma arma e munição real e que efetuou disparos em direção ao interior da pista". 

APELAÇÃO Nº 7000341-16.2020.7.00.0000

Imagem: Agência Brasil

O Superior Tribunal Militar manteve, na terça-feira (17), a condenação de um homem acusado de assaltar e levar a arma, uma espingarda calibre 12, de uma sentinela do Exército, responsável pela segurança da Granja do Torto, residência oficial da Presidência da República, em Brasília. O réu, que era um desertor do Exército, foi condenado a 5 anos e quatro meses de reclusão. 

De acordo com a denúncia do Ministério Público Militar (MPM), no dia 9 de dezembro de 2014, por volta das 3h da manhã, o denunciado, armado de uma pistola, juntamente com outros dois homens, subtraiu a espingarda, de propriedade do Exército Brasileiro, que era usada pelo soldado da força. 

Segundo os autos, o soldado estava de sentinela na residência oficial do Torto, na função de sentinela do Posto 04, quando foi abordado pelos assaltantes.

Eles teriam invadido clandestinamente a área militar por meio de um furo feito por eles na cerca local. Dominado, o militar foi obrigado a acompanhar os assaltantes até a cerca que protege o perímetro da residência e, após passarem pelo buraco, seguiram por uma estrada de chão, na orla da mata, em direção à BR-020.

Durante todo o trajeto a sentinela disse que era ameaçado de morte pelos homens. Depois disso, os algozes liberaram o militar e fugiram em um veículo estacionado às margens da rodovia. 

A denúncia conta também que três dias após o roubo da espingarda, enquanto ainda se buscava notícias do paradeiro do armamento roubado, o Centro de Operações da Polícia Militar do estado do Goiás, na cidade de Águas Lindas, recebeu informações de que um cidadão havia efetuado dois disparos em via pública com uma arma do tipo espingarda. Testemunhas indicaram a casa do réu como sendo o autor dos disparos.

O morador fugiu, mas policiais militares localizaram no quintal da residência a espingarda do Exército que tinha sido roubada da sentinela do “Torto”. Ainda na residência, os policiais encontraram a documentação do acusado, que foi identificado como soldado do 1º Regimento de Cavalaria de Guardas, quartel do Exército na capital federal. Na mesma noite, ele foi localizado e preso.

Nos autos, o denunciado afirmou inicialmente que roubou o armamento com a finalidade de intimidar um desafeto que lhe teria jurado de morte. No depoimento na delegacia, disse que sabia como se dava a movimentação da guarita 4 da Granja do Torto, “pois já havia tirado serviço lá, tendo ido ao local exatamente com a intenção de roubar uma arma de fogo”. 

Porém, em juízo, o acusado negou o crime. Afirmou que no dia dos fatos, não chegou nem próximo à residência oficial do Torto e que a espingarda com a qual efetuou disparos não foi roubada do quartel, mas era uma "cartucheira", que não estava registrada. Disse também que, ao fugir depois de ter efetuado os disparos em via pública, jogou a "cartucheira" na "ladeira" próxima a sua casa, mas a polícia encontrou justamente a espingarda que foi roubada do quartel. 

O Ministério Público Militar denunciou o homem à Justiça Militar Federal pelo crime de “penetrar em fortaleza, quartel, estabelecimento militar, navio, aeronave, hangar, ou em outro lugar sujeito à administração militar, e pelo crime de roubo em área militar, ambos previstos no Código Penal Militar.

Auditoria de Brasília 

Em novembro de 2015, no julgamento de primeira instância, ocorrido na 2ª Auditoria de Brasília, os juízes resolveram, por unanimidade, condenar o acusado à pena de oito anos de reclusão. A Defensoria Pública da União, inconformada com a condenação, resolveu apelar ao Superior Tribunal Militar (STM).

A defesa pediu a absolvição, por falta de provas, suscitando o princípio do in dubio pro reo. “As provas que embasaram o decreto condenatório mostram-se extremamente frágeis, na medida em que não conduzem à certeza quanto à autoria do delito, mas sim a meras conjecturas de caráter subjetivo e ilações de testemunhas após o fato da subtração”, sustentou o advogado. 

Julgamento do STM

Ao analisar o recurso, na última terça-feira, o ministro relator, Cleonilson Nicácio Silva, manteve a condenação do militar, mas reduziu a pena aplicada para cinco anos e quatro meses de reclusão, por achá-la desproporcional.

De acordo com o magistrado, os elementos indiciários extraídos dos depoimentos do réu e das demais testemunhas conferem verossimilhança à versão apresentada pelo acusado na fase pré-processual e conduzem à conclusão de que ele realmente cometeu o crime.

“É inegável a reprovabilidade da conduta do réu que, demonstrando conhecimento da rotina dos militares encarregados da segurança, rompe a cerca da Residência do Torto, uma das moradias oficiais da Presidência da República, no meio da noite e, em sequência, rende colega de farda, forçando-o a percorrer grande distância até o local em que pôde se evadir da cena do crime levando consigo uma arma calibre 12 pertencente ao Exército Brasileiro”, fundamentou o relator.

Apesar de o acusado ter afirmado inicialmente que foi torturado, Cleonilson Nicácio Silva afirmou que o ex-militar desdisse em juízo as imputações e que elas são absolutamente inverossímeis. “Comprovam as conclusões anteriormente expendidas segundo as quais a versão apresentada pelo acusado na fase inquisitorial, no tocante à confissão da prática delituosa, é a que mais corresponde à verdade dos fatos, em que pese ter sido retratada em juízo”, arguiu o magistrado.

Ao minorar a pena aplicada ao acusado, o ministro disse que “a alta intensidade do dolo”, interpretada pelos juízes de primeiro grau, além de não justificar concretamente o juízo de reprovabilidade da conduta do acusado, utilizou-se de referências vagas, não sendo possível, nesses termos, corroborar o aumento da pena-base.

“Embora reconhecendo a gravidade do delito de roubo de arma de fogo pertencente às Forças Armadas, a exasperação da pena-base em patamar superior ao mínimo legal, ao meu sentir, revelou-se desproporcional, consideradas as particularidades elencadas na instrução criminal”. Por unanimidade, os ministros do STM acataram o voto do relator.

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Foto: Ichiro Guerra/PR

O Superior Tribunal Militar (STM) mudou o entendimento de primeiro grau que havia absolvido uma médica de homicídio culposo, e a condenou à pena de dois anos, um mês e 15 dias de detenção, a ser cumprida em regime inicial aberto. A decisão ocorreu no dia 1º de agosto.

A denúncia do Ministério Público Militar (MPM) conta que, na noite do dia 21 de outubro de 2014, na sala do centro cirúrgico do Hospital de Guarnição de Porto Velho, em Porto Velho (RO), o 1º sargento do Exército Armindo dos Santos Oliveira morreu após perder muito sangue, em decorrência de complicações pós-operatórias de cirurgia eletiva de amigdalectomia - operação de retirada das amígdalas.

Na tarde daquele dia, por cerca de duas horas, o sargento foi submetido à  cirurgia, sob responsabilidade da acusada, uma segundo tenente médica do Exército, especialista  em otorrinolaringologia. A equipe médica era ainda composta por um tenente coronel, especialista em anestesiologia; um terceiro sargento, técnico de enfermagem, que atuou como circulante; e por uma servidora civil, técnica em enfermagem, que atuou como instrumentadora.

Complicações, após o procedimento, levaram  o sargento à morte,  por negligência, segundo o MPM. O militar  permaneceu no centro cirúrgico até as 18h30, quando foi liberado para  enfermaria, consciente e com sinais vitais estáveis. Na oportunidade, a mulher do sargento recebeu explicações sobre o motivo  da  demora na operação e foi orientada sobre procedimentos do pós-cirúrgico, como a ingestão  de  sorvete  e  compressas  geladas  na  região  cervical, como medidas adicionais.

Hemorragia

Logo após, já na enfermaria, o paciente começou a apresentar diversos episódios de volumosos sangramentos. O médico plantonista da emergência do HGuPV foi acionado e fez diversos procedimentos para conter a hemorragia, sem sucesso.  Por volta das 20h, o plantonista decidiu acionar a médica responsável pela cirurgia, a mesma que se tornaria ré na ação penal, solicitando que ela retornasse ao hospital para reavaliá-lo. Ela chegou 20 minutos depois e por mais 30 minutos tentou procedimentos para estancar a hemorragia.

Ainda segundo o Ministério Público Militar, embora ciente dos graves episódios de sangramento, a médica manteve-se recalcitrante em tornar a decisão de reabordagem cirúrgica do paciente, mantendo conduta conservadora com relação às estratégias para contenção do sangramento, prescrevendo a ingestão de sorvete, compressa gelada na região cervical e administração de medicação anti-hemorrágica, as quais já há muito teriam se mostrado ineficazes. 

Já perto das 23h, o quadro clínico do paciente se agravou muito. A médica foi chamada novamente ao hospital, mas não teria priorizado o atendimento do sargento. O paciente já se encontrava em estado de “choque hipovolêmico”, queda importante da oxigenação, pressão arterial muito baixa e sangramento contínuo e incontrolável.

“A ré pegou o tubo para realizar a intubação, mas saiu para atender um telefonema, deixando o tubo em cima do peito do sargento, mesmo diante da gravidade do quadro”, disse o MPM na peça de apelação.

O militar sofreu uma parada cardiorrespiratória ainda na maca, a caminho do centro cirúrgico. As tentativas de reanimação, já no centro cirúrgico, demorariam cerca de 30 minutos, sem sucesso. A declaração de óbito foi firmada pela própria médica, tendo como causa mortis "choque hipovolêmico, devido a pós-operatório de amigdalectomia".

Para o MPM, a Comissão de Ética Médica também afirmou haver indícios de negligência da médica na condução do caso. “Com base na documentação enviada a esta Comissão de Ética, é possível afirmar que há indícios de negligência na condução do caso em questão, no pós-operatório, realizado pela médica".

Julgamento no STM

Na primeira instância da Justiça Militar da União (JMU), em Manaus (AM), a médica foi absolvida da acusação de homicídio culposo, por negligência médica. Mas o MPM recorreu ao Superior Tribunal Militar para tentar reverter a decisão do colegiado de primeiro grau. 

Na Corte, foi relator o ministro Carlos Augusto Amaral Oliveira, que votou para manter a sentença de absolvição da primeira instância. No entanto, a ministra Maria Elizabeth Rocha, revisora da apelação, teve entendimento divergente  e votou por condenar a médica.

Em seu voto, a ministra disse que, dos relatos apresentados em juízo, percebe-se que, mesmo sendo alertada sobre a hemorragia incontrolável por várias pessoas, a atitude da médica foi uma só: minorar a gravidade do quadro clínico do sargento e insistir que os episódios de perda sanguínea eram normais e estavam sob “aparente controle”.

“Agregue-se ao trágico episódio, o fato do médico de plantão ter comunicado à médica, por volta das 21h, sobre os exames que demonstraram a necessidade de rápida intervenção emergencial”, disse a revisora.

Ainda de acordo com a ministra Maria Elizabeth, a passividade da médica ante o estado de gravidade de seu paciente constitui verdadeiro ultraje à medicina e vilipendia a classe otorrinolaringológica.

"Desse modo, entendo que a eventual preservação do veredicto absolutório coroará a impunidade e permitirá que o labor cirúrgico assim como o acompanhamento pós-operatório continuem a ser realizados sem a devida atenção a que merecem”, votou.

Por maioria, os ministros do STM acompanharam o voto da revisora e condenaram a médica pelo crime de homicídio culposo, com o direito de continuar recorrendo em liberdade.

APELAÇÃO Nº 7000357-33.2021.7.00.0000

Ministro Odilson Sampaio Benzi, relator da Apelação

O Superior Tribunal Militar (STM) mudou entendimento da primeira instância e condenou um major do Exército a mais de dois anos de reclusão pelo crime de participação ilícita em empresa privada. O major participou, ilicitamente, da administração de uma empresa, que prestava serviço de aulas práticas de máquinas pesadas a militares da 1ª Companhia de Engenharia de Combate Paraquedista (1ª Cia E Comb Pqdt), na cidade do Rio de Janeiro. O crime está previsto no artigo 310 do Código Penal Militar (CPM).

A denúncia do Ministério Público Militar (MPM) informa que em novembro de 2009, o então comandante da Companhia firmou acordo verbal com uma empresa, que passou a disponibilizar carreta para transporte de retroescavadeira; combustível diário (50 litros de óleo diesel ao dia); refeições aos alunos, insumos do tipo brita, areia, cascalho, manilhas, e, em troca, a empresa ministraria as aulas práticas a seus alunos do curso de operação de máquinas pesadas, civis e militares, realizando obras dentro do quartel, dentro de um programa chamado “Soldado Cidadão”, criado pelo Exército para profissionalizar militares recrutas.

O acordo funcionou até meados de 2012, totalizando 54 turmas de alunos civis e três turmas de alunos militares, cuja arrecadação importou no montante de R$ 594 mil.

A relação pessoal do major com a empresa contratada continuou intensa, inclusive tendo o militar se casado com a proprietária. Posteriormente começou a administrá-la, segundo denunciou o MPM.

Alertado de que a empresa não poderia atuar sem licitação e sem um contrato formal, o major, que era o comandante do quartel, solicitou ao Ordenador de Despesas da Brigada de Infantaria Paraquedista a abertura de processo licitatório, em setembro de 2011.

Efetuada a pesquisa de preço em quatro empresas, entre elas a de sua companheira, obteve-se o valor de R$ 36 mil. Não havendo interessados no pregão eletrônico, foi declarado deserto e dispensada a licitação.

No mesmo dia, o Instituto Nacional de Preservação da Memória dos Ex-Combatentes (INPMEC) apresentou proposta para fornecer o serviço, sendo contratada, mas terceirizou o serviço à empresa pertencente à mulher do major.

Os promotores também denunciaram que a viatura oficial do comandante foi utilizada em diversas ocasiões para fins particulares, seja para o transporte da dona da empresa e inclusive para atividades particulares.

A denúncia conta também que militares do quartel chegaram a fazer segurança armada no centro da cidade do Rio de Janeiro, quando da ida a bancos e efetuação de saques por parte da proprietária da empresa.

“Em outras oportunidades, acompanhou o comandante e a sua senhora em obras na cidade do Rio de Janeiro, a fim de buscar parceria com empresas, oferecendo cursos profissionalizantes de operador de máquina pesada; que por vezes se dirigia a empresa para levar e apanhar documentos ou objetos”, escreveu o Ministério Público Militar.

Outra acusação foi a de que o oficial passou a contratar militares do quartel para serem instrutores da empresa e os liberava até de escala de serviço do quartel.

“Um sargento foi retirado da escala de serviço na OM e passou a cumprir expediente integral na sede da empresa, de março a junho de 2012, recebendo cerca de R$ 2 mil no período, tudo sob determinação do comandante.”

Um ano depois, o relacionamento amoroso entre o comandante e a proprietária da empresa chegou ao fim, assim como a parceria empresarial, quando o oficial assumiu o comando da escola de máquinas pesadas e destituiu a antiga companheira, que em depoimento afirmou que o major recebia dinheiro dos alunos militares e ficava com a parte dele.

Denunciado à Justiça Militar da União, junto à 3ª Auditoria Militar da 1ª CJM (Rio de Janeiro), o major respondeu por dois crimes: peculato (303) e participação ilícita (310) .

No julgamento de primeira instância, ocorrido em 31 de março de 2015, Conselho Especial de Justiça para o Exército, da 3ª Auditoria da 1ª CJM, por unanimidade de votos, julgou improcedente a denúncia e o absolveu de todos os crimes, por falta de provas ou por considerar que o fato não era crime.

O Ministério Público Militar recorreu da decisão junto ao Superior Tribunal Militar, argumentando que acusado fez uso reiterado da viatura oficial para atender interesse particular, não se tratando de mero peculato de uso, e que ele participou simuladamente e por interposta pessoa, no processo licitatório vencido, estando, portanto, configurada a prática dos crimes previstos nos artigos 303 e 310 do CPM.

Recurso ao STM

Ao analisar o recurso de apelação, nesta quinta-feira (8), o ministro Odilson Sampaio Benzi acatou parcialmente o pedido do Ministério Público e condenou o major, ex-comandante da 1ª Companhia de Engenharia de Combate Paraquedista, em um dos crimes.

Segundo o relator, embora tenha negado a prática do delito em Juízo, o conjunto probatório dos autos demonstra que o major praticou a conduta descrita no artigo 310 do CPM.

“O acusado, no Comando da 1ª Cia E Comb Pqdt, laborou dentro da Organização Militar em busca de satisfazer interesse próprio de lucro, ou de pessoas que lhe eram próximas, em negócios jurídicos com entes privados, quando deveria apenas fiscalizar e zelar pelos interesses da Administração”.

Segundo o ministro Benzi, a prova documental demonstra que ele participava ativamente de reuniões na empresa, conduzindo interesse privado, quando exercia função pública.

“Como se vê, a prova documental e a prova testemunhal demonstram que o acusado, sendo comandante da 1ª Cia E Comb Pqdto, manteve vínculo técnico, econômico e gerencial com a empresa, designando, inclusive, militares da OM para dar expediente na empresa”.

Em relação ao delito de peculato, o relator argumentou que se tira dos autos que algumas vezes militares e veículos pertencentes à Administração foram utilizados de forma incomum ao que determina os regulamentos militares e princípios administrativos, ocorrendo desvio do interesse e do fim público.

“Contudo, tenho que os desvios cometidos não caracterizam o delito de peculato, art. 303 do CPM. Isso porque o peculato se trata de um delito especial de apropriação indébita cometida por funcionário público, sendo que a vontade do agente se dirige a conquista definitiva do bem móvel.

No caso, não restou configurado que o acusado inverteu a propriedade do bem público, mas que apenas o utilizou de forma indevida e o restituiu nos termos em que foi retirado da Administração, descaracterizando o tipo penal de peculato art. 303 do CPM”.

A pedido do Ministério Público, o réu foi absolvido do delito previsto no artigo 204 - exercício ilegal de comércio - por não haver a compravação do crime.

O ministro disse que o pleito de condenação do acusado no artigo 320 do CPM, ou a desclassificação para o art. 324 do CPM, como requerido pela Procuradoria-Geral da Justiça Militar, no recurso de apelação, extrapolaria os limites ou a extensão do escopo do recurso de apelação interposto pelo Ministério Público Militar, acarretando sério prejuízo para a parte defensiva.

“Isso porque não houve oportunidade de a Defesa se manifestar sobre a pretensão da Procuradoria, o que seria imperativo, sob pena de violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

"Cabe lembrar que o princípio do contraditório pressupõe que seja garantida à Defesa a possibilidade de rebater as teses acusatórias, o que não ocorreu no presente caso, pois o pleito de condenação do acusado no delito do art. 320 do CPM, ou mesmo sua desclassificação para o art. 324 do CPM, veio a ocorrer após as contrarrazões defensivas, na última fase do processo, antes deste julgamento, surpreendendo a Defesa.

Isso viola os princípios do contraditório e da ampla defesa, além, é claro, de acarretar prejuízo irreparável para a parte defensiva, razão pela qual tenho que a matéria a ser analisada por esta instância Superior encontra-se limitada apenas ao pedido feito pelo Ministério Público Militar em seu recurso”, afirmou.

Na dosimetria da pena, o ministro Benzi conheceu e deu parcial provimento ao recurso ministerial para, reformar a sentença, condenar o major do Exército, como incurso no crime previsto no artigo 310 do CPM - participação ilícita - , à pena em 2 anos, 4 meses e 24 dias reclusão, a ser cumprindo, inicialmente, em regime aberto, com o direito de recorrer em liberdade. Por unanimidade, os demais ministros da Corte acataram o voto do relator. 

A sessão de julgamento foi transmitida ao vivo pela internet. Assista à gravação (em 1:51:40)

Processo Relacionado 

APELAÇÃO N.° 214-24.2012.7.01.0301/RJ

O Superior Tribunal Militar (STM) manteve a condenação de um médico a dois anos de reclusão, por ter recebido, por cerca de 30 anos, proventos de invalidez como cabo aposentado da Força Aérea Brasileira. O ex-militar foi aposentado por invalidez, após diagnóstico de um grave câncer, em 1975, e desde então assumiu o cargo de médico na prefeitura municipal de Natividade (RJ).

Segundo a denúncia do Ministério Público Militar (MPM), o réu foi transferido para a inatividade em 30 de junho de 1975, após ter recebido o direito ao auxílio-invalidez. No entanto, mesmo gozando de pensão por invalidez, ele voltou a trabalhar a partir de agosto de 1984, tomando posse no cargo de servidor público da Prefeitura de Natividade (RJ), permanecendo em exercício até 30 de abril de 2013, ocasião em que se aposentou por tempo de serviço.

Descoberta a fraude, a Aeronáutica abriu um Inquérito Policial Militar (IPM). Na oportunidade, o denunciado afirmou, em depoimento, que adquiriu o direito da pensão por invalidez ao ser diagnosticado com câncer no sistema linfático, sendo considerado incapaz para trabalhar nas Forças Armadas, onde serviu por oito anos. No entanto, apesar de sua invalidez, ocupou nova vaga no serviço público da Prefeitura Municipal, no cargo de médico.

Disse também que a reforma se deu no quarto ano de faculdade de medicina e que o câncer foi diagnosticado quando ele tinha cerca de quatro anos de FAB e teria passado por cirurgias, mas havia dúvida quanto ao diagnóstico. Afirmou também que agiu conforme a orientação do médico e foi dada a reforma. E que hoje está tecnicamente curado da doença, mesmo tendo recusado o tratamento de quimioterapia na época.

Os prejuízos à Fazenda Nacional foram avaliados R$ 235.545,46. Nada foi restituído ao Erário.

Em 2014, o ex-militar foi denunciado junto à Justiça Militar da União, na 4ª Auditoria do Rio de Janeiro, sendo condenado pelo crime previsto no artigo 251 – estelionato – do Código Penal Militar (CPM), por ter acumulado ilegalmente duas fontes remuneratórias, desrespeitando o Decreto 4.307/2002.

A pensão por invalidez foi concedida sob a égide da Lei 5.774/71, já revogada, mas que, já naquela época, vedava ao beneficiário de aposentadoria por invalidez o retorno ao trabalho com a preservação do benefício. Pela legislação, inválido é definido como aquele que não é apto a exercer nenhuma função laborativa.

Na peça acusatória, o Ministério Público Militar (MPM) sustentou que o denunciado, mesmo admitindo ter conhecimento dessas informações, optou pelo uso de ardil, ao anotar informações falsas em sua declaração de invalidez no qual atestou não exercer "qualquer atividade remunerada, pública ou privada”, mantendo assim a Administração Militar em erro até a comunicação dos fatos feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

Em fevereiro deste ano, no julgamento de primeira instância, o Conselho Permanente de Justiça, decidiu, por maioria de votos (3x2), julgar procedente a denúncia e condenou o réu à pena de 2 anos de reclusão, com o benefício do sursis (suspensão condicional da pena) pelo prazo de 2 anos e o direito de apelar em liberdade. 

A defesa do médico recorreu ao Superior Tribunal Militar (STM), em Brasília.

Nas folhas de antecedentes criminais, em análise na Corte Militar, identificou-se dois registros de ocorrência policial em nome do réu. Um deles resultou numa condenação de quatro anos de reclusão, por homicídio, pena cumprida em regime semiaberto.

Condenação no STM

Ao analisar o recurso de apelação, o ministro relator no STM, Alvaro Luiz Pinto, manteve a condenação imposta no primeiro grau da Justiça Militar da União.

Segundo o magistrado, ao analisar o acervo probatório acostado ao processo, foi possível concluir que o acusado praticou a conduta de estelionato ao se apresentar, anualmente, ao quartel da Aeronáutica, e assinar uma declaração de que não exercia função remunerada, quando, de fato a exercia.

O ministro informou também que o apelante confirmou os fatos narrados na peça acusatória, confessando ter assumido o cargo de médico na prefeitura de Natividade no ano de 1984, quando já havia sido reformado (sua reforma se deu em 1975), e, portanto, já fazia jus ao auxílio-invalidez e destacou um trecho do Interrogatório do réu em Juízo: “(...) que havia uma apresentação anual e lá tinha que assinar que não exerce função remunerada e o acusado o assina por ter o entendimento de ser o Decreto injusto (...) que considerou a reforma uma espécie de indenização (...)”.

Para o relator, as informações prestadas anualmente pelo apelante, com a finalidade de continuar recebendo o auxílio-invalidez, demonstram o dolo do agente em manter a Administração Militar em erro.

“As considerações feitas pelo apelante, em seu interrogatório, acerca da 'justiça' ou 'injustiça' da lei que proíbe o acúmulo das fontes de proventos antes mencionadas, reforçam o seu conhecimento da legislação pertinente e a sua intenção em manter a Administração Militar em erro. Também não constam dos Autos quaisquer provas de que, como dito pela Defesa, o Réu não tinha a vontade livre e consciente de praticar o delito de estelionato. Ao contrário, a intenção de auferir vantagem financeira ficou comprovada tanto pelas declarações prestadas em sede de interrogatório do Réu, como pelos documentos acostados aos Autos”, fundamentou.

O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao Apelo defensivo e manteve inalterada a sentença de condenação.

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