O Superior Tribunal Militar (STM) decidiu, por unanimidade, declarar a indignidade para o oficialato de dois coronéis da Aeronáutica (FAB), atendendo a duas representações individuais apresentadas pelo Ministério Público Militar (MPM).
Ambos os militares foram condenados criminalmente pelo próprio Tribunal, em 2017, a quatro anos e seis meses de reclusão pelo crime de estelionato, após participarem de um esquema fraudulento que desviou quase dois milhões de reais da Diretoria de Engenharia da Aeronáutica (DIRENG), situada na cidade do Rio de Janeiro, no Galeão.
A fraude consistia em dar aparência de legalidade à aquisição de materiais de informática que nunca foram entregues. O esquema envolvia a emissão de notas fiscais falsas, documentos fraudulentos e a simulação completa de um processo de compra, desde a elaboração de pedidos até a certificação inexistente de recebimento dos itens.
A atuação dos militares no esquema
Segundo a ação julgada pelo STM, o primeiro coronel, que à época exercia as funções de agente de controle interno e chefe da Seção de Provisões da DIRENG, foi o principal responsável pela construção documental que sustentou o esquema fraudulento.
Ele elaborou os pedidos de material e serviço que totalizavam o valor do prejuízo, produziu o termo de referência, a justificativa de contratação e a relação de itens, autorizou a adesão a pregões, viabilizou a emissão de notas fiscais e de empenho e certificou falsamente, no verso dessas notas, o recebimento dos produtos. Além disso, convocou subordinados a assinar o termo de recebimento definitivo sem que tivessem a oportunidade de conferir fisicamente os bens.
A solicitação incluía grande quantidade de toners, cartuchos e hard disks — muitos voltados para impressoras que sequer existiam na unidade.
O segundo coronel, então chefe de gabinete do diretor de Engenharia, atuou como ordenador de despesas, autorizando a abertura do procedimento ilícito e assinando documentos “por impedimento do Ordenador de Despesas”, embora o titular da função estivesse presente na organização militar.
Sua assinatura viabilizou a emissão das ordens bancárias que permitiram o repasse indevido de quase dois milhões de reais à empresa envolvida no esquema. Ele também aconselhou a nomeação de uma comissão de recebimento formada por militares subordinados e sem conhecimento técnico na área de informática, contribuindo para a execução da fraude.
Argumentos do Ministério Público Militar
Nas representações, o MPM sustentou que a conduta dos dois oficiais configurou grave violação penal militar e representou “total desprezo pelos deveres militares”. Ressaltou que, como gestores públicos — um responsável pelo controle interno e outro pela ordenação de despesas —, ambos detinham obrigação superior de probidade e moralidade, mas usaram seus cargos estratégicos para facilitar o crime.
O MPM enfatizou também que os coronéis envolveram subordinados no esquema, obrigando-os a assinar documentos falsos ou integrando-os a comissões sem qualificação técnica para verificar os materiais supostamente adquiridos.
Fundamentação do relator
Ao votar pela procedência das representações, o ministro relator Cláudio Portugal De Viveiros afirmou que a conduta dos dois coronéis “maculou a honra individual, o pundonor militar, o decoro da classe e a imagem da Força Aérea Brasileira”, configurando violação direta ao dever de fidelidade à Instituição.
Para o relator, a gravidade dos fatos — envolvendo fraude sofisticada, prejuízo milionário, abuso de funções de confiança e manipulação de subordinados — comprometeu de forma irreversível a condição dos oficiais de permanecerem no oficialato.
O ministro ressaltou que ambos se valeram de cargos de alta responsabilidade para dar aparência de legalidade ao esquema e agir contra o patrimônio da própria Força. Essa ruptura consciente e deliberada com os valores basilares das Forças Armadas, segundo ele, torna incompatível a manutenção do status de oficial.
Com base nos fundamentos apresentados, o Plenário do STM concluiu pela procedência das duas representações, declarando a indignidade dos coronéis para o oficialato. A decisão tem caráter ético-institucional e decorre da prática de crime doloso com repercussão direta na honra e nos princípios militares.
Representação p/ Declaração de Indignidade/Incompatibilidade
Nº 7000327-56.2025.7.00.0000/DF
Representação p/ Declaração de Indignidade/Incompatibilidade
Nº 7000328-41.2025.7.00.0000/DF